o grande vício dos lavores


tal como diz o título, me assumo. lavores, manualidades, trabalhos manuais. como lhe quiserem chamar: venha a mim o vosso reino. sou completamente viciada, perco a noção do tempo, perco-me em lojas com materiais e, quando há uns anos recomecei, não consegui parar. isto chega a tal ponto que rejubilei, no meu último aniversário, quando me ofereceram uma máquina de fazer pasta e um exemplar (antigo) do Grande Livro dos Lavores (já devo ter dito isto, de certeza). como uma criança, pensei: foram as melhores prendas da minha vida! 
desde miúda que faço coisas: costura, bordados, malha, rabiscos em papel, colagens. no 7º e 8º anos de escolaridade, escolhi Têxteis e Horto-floricultura; fui feliz mexendo na terra, a ver crescer alfaces e morangos e a montar mini-trabalhos em arraiolos. passei horas em casa duma colega de liceu, aprendendo a bordar e usufruindo da paciência da sua mãe (e que acedeu, generosamente, ao meu pedido para que me ensinasse). 
aos poucos, sinto-me a voltar às origens, não só porque tenho uma necessidade tremenda de criar, de gastar energia duma forma positiva, construtiva, mas também, começo a perceber, porque foi isso que vi, toda a vida, a minha mãe fazer. umas vezes porque significava poupar dinheiro, como as costuras à máquina. não que fosse a coisa que a minha mãe mais gostasse de fazer, mas ainda assim fazia e que bom que era usar aquela roupa! lembro-me, com saudade, dum casaco branco de Primavera - Verão, cheio de bolsos e presilhas e feito com ajuda duma vizinha perita. as horas de ócio eram (e são hoje) horas de trabalho. e, acreditem, sabe muito bem. apesar da dificuldade enorme que tenho em gerir o tempo para este ócio criativo e a vontade de ler. ou entre este ócio criativo, a vontade de ler e a vontade (e necessidade) de dormir. 
há dias falava com uma alemã, perto dos 60 anos, com quem me cruzei por acaso; percebemos esta necessidade comum, este ímpeto que nos obriga a ter a casa cheia de linhas, tecidos, materiais de tudo e mais alguma coisa. os olhos que brilham quando nos deparamos com uma feira de rua com montes de coisas que, abandonadas, nos pedem ajuda para terem uma nova vida. é um desejo tão transversal a diferentes idades, diferentes culturas. e ainda acrescentou, esta minha conviva, que tinha pena por não ser este um hábito no seu país: o de fazer com as próprias mãos.
longo texto e um grande propósito. 
aqui expliquei porque não sabia fazer renda e como a necessidade e curiosidade me aguçaram o engenho. por mero acaso, este sábado acabei por ir parar, de novo, à Retrosaria. já tinha visto o workshop de Iniciação ao crochet mas, como tinha outros planos, não me inscrevi. quis o destino que o fim-de-semana se libertasse, que houvesse vaga e lá reservei eu o lugar. ainda pensei em mandar um email a explicar que era canhota mas deixei-me de ideias tolas, até porque se consegui fazer o cordão (ou corrente, como quiserem chamar) com as duas mãos, o resto também conseguiria.
e assim foi. pouco mais de quatro horas, na companhia da Rita Cordeiro e de outras duas aprendizes espectaculares. um verdadeiro luxo. sentadas numa casa antiga, no meio dum bairro lindo, com uma professora incansável, muita conversa e um trabalho que se fez rápido, sem esforço e com alegria. a minha teimosia fez-se sentir e, apesar da querida Rita ter insistido que não se importaria de tentar ensinar em espelho e de me ter dito que fizesse com a mão esquerda, achei por bem testar os meus limites e ir fazendo os pontos com a mão direita. não me custou nada, embora confesse que o resultado não terá ficado tão perfeito como gostaria ou como acho que seria possível com a outra mão. aliás, podem atestar esta minha opinião pelas fotos! (risos)


|fotos: Carla Martins|



e se não conhecem o trabalho da Rita Cordeiro, não sabem o que perdem. dum bom gosto, duma diversidade e criatividade esplêndidas. visitem o cooler e o wooler e, prometo, ficarão deslumbrados.

no meio desta onda criativa, e porque queria fotografar a amostra de pontos que fiz no workshop, não consegui deixar de brincar com os materiais e a luz de final de dia. aproveitei para tirar mais umas fotos e testar potencialidades da máquina (não me canso das macros desta Nikon!).


e é assim que esta semana começa. com uma sensação de felicidade a pairar. aquela felicidade de unir, peça-a-peça, um puzzle e começar a ver a imagem final. de juntar saberes e conhecer pessoas com o mesmo desejo, a mesma necessidade de fazer. beber o conhecimento de quem se presta a partilhar o que sabe. de olhar para os materiais e até já saber o que fazer com eles. de poder imaginar peças e juntar técnicas. da perfeita noção de que saber-fazer é infinitamente mais gratificante que o glamour duma qualquer marca da praça, sabe-se lá fabricada onde e com que meios humanos.

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